O sol está a pé já há várias horas e eu não aguento mais estar em casa. Pego numa bolsa (daquelas de usar à tiracolo) grande o suficiente para poder transportar uns quantos bens essenciais – as chaves de casa, o telemóvel, um caderno, uma lapiseira, um livro, um leitor de cd’s… (quando viajo sem destino gosto de estar prevenida!). Ao atravessar a ombreira da porta, da fresca penumbra do átrio de entrada para a luminosidade feroz da rua, noto que o ar que se respira é morno e parado; mesmo com roupa fresca a temperatura não convida a grandes passeios. Quase maquinalmente, faço o caminho para o meu cantinho de sossego. Aí, sob os ramos piedosos de uma grande amoreira, encontro a frescura e a paz por que ansiava.
Do meu lugar central, numa das últimas filas do anfiteatro de pedra, tenho uma vista privilegiada do cenário em redor: para a esquerda, um homem de fato lê o jornal e, mais abaixo, senta-se uma velha senhora, de olhos fixos nas agulhas de tricô; abaixo de mim, uma adolescente, com uma revista aberta no colo, faz uma dança frenética com os polegares sobre o teclado do telemóvel; para a direita, ao nível do chão, um casal conversa calmamente, relanceando de quando em quando para o petiz que corre atrás da bola; mais longe, um rapaz, de headphones nos ouvidos, balança a cabeça ao ritmo da música que só ele ouve. Feito o reconhecimento do local, pego no livro e recomeço a leitura onde o marcador indica.
Os únicos sons são o chilrear dos pássaros, escondidos na folhagem das árvores, e o restolhar de folhas ao levantarem voo apressadamente. Também as horas voam e o sol começa a esconder-se por detrás dos edifícios, no horizonte. Noto os olhos cansados, as letras a bailarem desconexas; ao levantar o olhar do livro, acordo daquela outra realidade em que havia mergulhado e apercebo-me da meia-luz que me envolve. Arrefeceu. Pouso o livro e olho em redor: estou sozinha e, algures, um grilo chama por uma fêmea. Levanto-me para sair – as pernas entorpecidas por estarem horas na mesma posição.
Já a caminho da saída dou pela falta do livro, que cabeça esta! Volto atrás e lá está, onde o deixara, pousado no banco contíguo àquele onde havia estado sentada. Inspiro o ar fresco e reparo como o lago, ao fundo, está calmo. Um sussurro (ou seria um zumbido de um qualquer insecto?) atrai o meu olhar. Ao longe, dois jovens sentam-se lado a lado. Ele, com o torso virado para ela, diz-lhe algo em tom íntimo. Ela olha em frente, respondendo apenas com um sorriso tímido. Instala-se um silencio embaraçoso, e cada um procura fervorosamente algo para dizer. Subitamente, ele inclina-se e, pegando-lhe no queixo, direcciona a boca para a dela: os lábios tocam-se, por meros segundos, num beijo atabalhoado. Ela desvia a face e, muda, demora o olhar nos dedos fortemente entrelaçados. Ele, atrapalhado, pede desculpa pelo atrevimento. Por detrás de mim, alguém que passa pigarreia. Os dois vultos esfumam-se no ar. Recordações… Volto-me e percorro o caminho para casa, com um sorriso nos lábios, pensando em como o Tempo tudo transforma.
Do meu lugar central, numa das últimas filas do anfiteatro de pedra, tenho uma vista privilegiada do cenário em redor: para a esquerda, um homem de fato lê o jornal e, mais abaixo, senta-se uma velha senhora, de olhos fixos nas agulhas de tricô; abaixo de mim, uma adolescente, com uma revista aberta no colo, faz uma dança frenética com os polegares sobre o teclado do telemóvel; para a direita, ao nível do chão, um casal conversa calmamente, relanceando de quando em quando para o petiz que corre atrás da bola; mais longe, um rapaz, de headphones nos ouvidos, balança a cabeça ao ritmo da música que só ele ouve. Feito o reconhecimento do local, pego no livro e recomeço a leitura onde o marcador indica.
Os únicos sons são o chilrear dos pássaros, escondidos na folhagem das árvores, e o restolhar de folhas ao levantarem voo apressadamente. Também as horas voam e o sol começa a esconder-se por detrás dos edifícios, no horizonte. Noto os olhos cansados, as letras a bailarem desconexas; ao levantar o olhar do livro, acordo daquela outra realidade em que havia mergulhado e apercebo-me da meia-luz que me envolve. Arrefeceu. Pouso o livro e olho em redor: estou sozinha e, algures, um grilo chama por uma fêmea. Levanto-me para sair – as pernas entorpecidas por estarem horas na mesma posição.
Já a caminho da saída dou pela falta do livro, que cabeça esta! Volto atrás e lá está, onde o deixara, pousado no banco contíguo àquele onde havia estado sentada. Inspiro o ar fresco e reparo como o lago, ao fundo, está calmo. Um sussurro (ou seria um zumbido de um qualquer insecto?) atrai o meu olhar. Ao longe, dois jovens sentam-se lado a lado. Ele, com o torso virado para ela, diz-lhe algo em tom íntimo. Ela olha em frente, respondendo apenas com um sorriso tímido. Instala-se um silencio embaraçoso, e cada um procura fervorosamente algo para dizer. Subitamente, ele inclina-se e, pegando-lhe no queixo, direcciona a boca para a dela: os lábios tocam-se, por meros segundos, num beijo atabalhoado. Ela desvia a face e, muda, demora o olhar nos dedos fortemente entrelaçados. Ele, atrapalhado, pede desculpa pelo atrevimento. Por detrás de mim, alguém que passa pigarreia. Os dois vultos esfumam-se no ar. Recordações… Volto-me e percorro o caminho para casa, com um sorriso nos lábios, pensando em como o Tempo tudo transforma.
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